segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Cinema Mudo


Luz, Câmera, Silêncio 

O Gordo e o Magro
    Voz? Trilha sonora de acompanhamento? Nada disso. A carência de tecnologia apropriada forçava os cineastas a produzirem filmes que não eram seguidos por uma sonoridade condizente com as imagens em desfile nas telas, mas isso não significa que eles eram partidários do silêncio absoluto. A escassez de som não impedia que a imaginação do telespectador voasse pela trama. Músicas simples ou rudimentares efeitos sonoros executados no momento da exibição compunham a pouca representatividade sonora das produções. O diálogo ficava por conta por gestos e letreiros explicativos. E nem pense que o público da época achava isso ruim, muito pelo contrário. 

     A ideia de combinar filmes com sons gravados é quase tão antiga quanto o próprio cinema. Até os anos 20 do século XX, os filmes eram mudos em sua maior parte. Os anos anteriores à chegada do som ao cinema são conhecidos como "era muda". Considera-se que a arte cinematográfica atingiu a maturidade plena antes da substituição dos filmes mudos por “filmes sonoros” e alguns cinéfilos defendem que a qualidade dos filmes baixou durante alguns anos, até que o novo meio sonoro estivesse totalmente adaptado ao cinema.

    Durante a “Era Muda”, nos locais de exibição das películas, em teatros, óperas ou feiras, as cenas cinematográficas eram acompanhadas por compassos tocados ao piano. Estas músicas variavam conforme as ações e o local no qual os filmes eram transmitidos, pois a escolha sonora dependia do ponto de vista do pianista sobre a obra exibida. Devido a essa relatividade, a compreensão geral dos filmes era realizada através da inserção de legendas, com o objetivo de tornar os acontecimentos mais claros para os que assistiam a película. 
Contrariando o pensamento de muitos, a qualidade visual dos filmes mudos muitas vezes foi alta. Muitos alegam que os filmes mudos eram primitivos e mal assistíveis para os padrões modernos. Este equívoco resulta de filmes mudos sendo reproduzidos na velocidade errada e em estado deteriorado. Muitos desses   filmes mudos existem apenas em cópias de segunda ou terceira geração, muitas vezes copiadas do estoque de filmes já danificado e negligenciado. Daí a impressão de que o filme mudo é sinônimo de baixa qualidade cinematográfica.


   Ao longo de trinta anos o que se conhecia por cinema se resumiu a esta modalidade, que já transmitia à plateia a magia que seria sua marca nos séculos posteriores, mesmo sem apoio sonoro. Apesar da ausência do som, as altas classes eram atraídas para esta esfera cultural, renovações eram introduzidas na produção dos filmes, todo o potencial desta nova arte era explorado. Uma revolução no modo de retratar realidades estava acontecendo. Mas a projeção cinematográfica criada pelos irmãos Lumiére,os inventores do cinematógrafo, primeiro instrumento utilizado para capturar imagens em movimento, ainda não era utilizada em todas as suas inúmeras possibilidades. As adaptações acopladas já permitiam ajustar som e imagem sincronicamente, mas os investimentos financeiros elevados que eram exigidos por esta tecnologia desestimularam os primeiros empreendedores cinematográficos. Eles preferiram aplicar seus recursos no trabalho de direção, na operação da câmara e na montagem das cenas.

   A data oficial da primeira projeção cinematográfica, fora do circuito científico, dirigida para o público comum, é 28 de dezembro de 1895. “A chegada de um trem à estação da cidade”, exibido para aproximadamente 100 pessoas, no subsolo do Grand Café em Paris, mostrava uma locomotiva se aproximando de uma estação ferroviária. Visto hoje, mais de cem anos depois de sua primeira exibição, o filme pode nos parecer bastante ingênuo, mas durante aquela exibição, houve quem saltasse espantado da cadeira, temendo que o trem “invadisse” a sala de cinema improvisada.

    Em pouco tempo, o que era uma grande novidade que maravilhava o mundo, corria o risco de se tornar uma moda passageira, já que com o passar do tempo, as pessoas se desinteressariam em assistir a filmes que exibiam trens em movimento, saídas de funcionários de seu trabalho, bebês se alimentando, além de carros, animais e pessoas em situações diversas, que era basicamente os temas de praticamente todos os filmes mudos. Não se fazia mais do que simplesmente mostrar a realidade. Não se criava uma trama, uma ficção.

    Esses filmes, simples e curtos, eram rodados em plano único e com a câmera sempre fixa. O uso da câmera em movimento foi, como muitas das descobertas do cinema, uma obra do acaso: o cinegrafista chefe dos Lumière estava em Veneza e resolveu fazer uma tomada de dentro de uma gôndola em movimento. O resultado surpreendente fez com que, depois disso, os filmes passassem a abusar do recurso, utilizando carros, carroças, elevadores, barcos como suporte para as câmeras. Foi Georges Méliès quem, a partir de 1896, iniciou a rodagem de filmes em curta-metragem utilizando recursos técnicos como o stop motion, a fusão, a transposição de imagens, a utilização de estúdios e figurantes, a iluminação artificial, a construção de cenários. Tais técnicas proporcionaram a renovação de que o cinema necessitava. Méliès foi ator e ilusionista, o que facilitou transportar a técnica do teatro e da mágica para o cinema. Produziu centenas de filmes, hoje marcos na história do cinema:

· “A viagem à Lua”, filme que mostra astronautas de fraque e cartola, viajando em um foguete que atinge o rosto da Lua;

· A primeira adaptação de “20 Mil Léguas Submarinas”, de Julio Verne;

· “O Túnel sob o Canal da Mancha”, que antecipava em 90 anos a construção do Eurotúnel, entre França e Inglaterra.

   O realismo de cenas de decapitação em seus filmes fez com que o governo francês proibisse a exibição de cenas parecidas em filmes. Foi a primeira censura a uma obra cinematográfica. Georges Méliès demonstrou que o cinema não servia apenas para gravar a realidade, mas também para criar a fantasia.

   O início da Primeira Guerra Mundial afetou os negócios na Europa e vários cineastas viajaram para os Estados Unidos, continuando a produzir filmes por lá. Depois da guerra, os americanos passaram a dar as cartas no mundo do cinema. A fundação dos grandes estúdios, entre as décadas de 1910 e 1920, posteriormente tornou Hollywood a principal referência do cinema no mundo. Nomes como D. W. Griffith, Edison, Porter, e companhias pioneiras como Biograph e Vitagraph, proporcionaram a fundação de uma grande indústria. Os grandes estúdios da Universal, Mutual, Keystone, Paramount, United Artists, Columbia, surgiram na época e dinamizaram a produção cinematográfica. Depois, vieram Buster Keaton, o Gordo e o Magro, protagonistas de comédias que até hoje mantém sua aura de brilhantismo e são capazes de encantar. Porém o mais encantador ator de filmes mudos foi Charles Chaplin.                                                                            

    Sir Charles Spencer Chaplin Jr. foi um ator, diretor e músico de origem britânica. Chaplin era um cômico genial, e sua simples presença era suficiente para o êxito comercial do filme, sendo a primeira lenda viva devido ao seu personagem, o vagabundo Carlitos. A personagem mescla a comédia sentimental, a sátira social e o “patético” da natureza humana, tornando-se um arquétipo universal. O personagem foi se firmando ao longo dos filmes "The Tramp", "A Dog's Life", "The Kid" e "The Gold Rush". Com a chegada do cinema sonoro, os produtores se negam a fazer "City Lights", então Chaplin o produz por sua própria conta e faz grande sucesso, êxito que se repete em "Modern Times", sátira sobre a automatização do trabalho, e "The Great Dictator", primeiro filme falado de Chaplin, uma “paródia” de ditadores, na figura de Adolf Hitler, o que lhe causaria inimizade entre os setores mais reacionários do poder estadunidense, obrigando-o a abandonar o país na década de 1950, quando houve a “caça às bruxas”, promovido por McCarthy. Algum tempo antes, em 1919, Chaplin, junto com D. W. Griffith e os dois mais famosos atores do momento, Mary Pickford e Douglas Fairbanks, formam a produtora United Artists, iniciando a era dourada do cinema mudo dos Estados Unidos.

   Todos os grandes nomes do cinema mudo foram parte de grandes trabalhos. Entre eles, os 10 mais lucrativos:

1. The Birth of a Nation (1915) - $10,000,000

2. The Big Parade (1925) - $6,400,000

3. Ben-Hur (1925) - $5,500,000

4. Way Down East (1920) - $5,000,000

5. The Gold Rush (1925) - $4,250,000

6. The Four Horsemen of the Apocalypse (1921) - $4,000,000

7. The Circus (1928) - $3,800,000

8. The Covered Wagon (1923) - $3,800,000

9. The Hunchback of Notre Dame (1923) - $3,500,000

10. The Ten Commandments (1923) - $3,400,000

11. Orphans of the Storm (1921) - $3,000,000

12. For Heaven's Sake (1926) - $2,600,000

13. Seventh Heaven (1926) - $2,400,000

14. Abie's Irish Rose (1928) - $1,500,000



    O cinema mudo no Brasil inicia em 19 de junho de 1898, com os equipamentos e filmes trazidos para o Brasil pelos irmãos Afonso Segreto e Pascoal Segreto, que ao chegar ao Rio de Janeiro, imediatamente começaram a fazer imagens, no próprio porto. Os Segretos foram, portanto, os pioneiros na captação de imagens em movimento no país, filmando eventos e cerimônias. Destaca-se, entre tais documentos, a visita do Presidente Prudente de Moraes, em 5 de julho de 1898. Em 13 de fevereiro de 1898, o médico José Roberto de Cunha Sales realiza uma das primeiras exibições do cinematógrafo em São Paulo. Em São Paulo, a primeira filmagem foi feita por Afonso Segreto em 20 de setembro de 1899, em uma celebração da colônia de imigrantes italianos. Atualmente, os pesquisadores consideram que os primeiros filmes realizados no Brasil foram "Ancoradouro de Pescadores na Baía de Guanabara", "Chegada do trem em Petrópolis", "Bailado de Crianças no Colégio, no Andaraí" e "Uma artista trabalhando no trapézio do Politeama".

   A primeira fase do cinema terminava, afinal, proporcionando as bases daquilo que marcaria a produção de cinema durante todo o século 20. A partir desses eventos pioneiros, o cinema se desenvolveu, até o aparecimento, em 1927, do filme O cantor de Jazz, que marcou o início do cinema falado e levou muitos atores, estúdios, diretores do cinema mudo à decadência. É um pouco sobre isso que trata o filme O Artista, que pode ser o primeiro filme mudo a ganhar o Oscar em 80 anos. O filme retrata, entre outras coisas, a decadência vertiginosa de muitos atores da passagem do cinema mudo para o filme falado. O diretor dialoga com as técnicas simples empregadas pelas produções pioneiras, como uma homenagem à sétima arte.

    É evidente que o cinema mudo foi o alicerce de tudo relacionado à gravação de imagens em movimento. Seus aspectos foram fundamentais para surpreender o mundo com a capacidade genial de ilustres pessoas e introduziu no pensamento humano uma nova maneira de admirar a realidade que nos cerca. 



Algumas Coisas Nunca Mudam - Lanterna Mágica Filmes